Conheça alguns dos planos nacionais de recuperação econômica em resposta à COVID-19

Brasil Programa Pró-Brasil Em 2020, o governo federal lançou um plano para estimular o crescimento econômico brasileiro após a crise da pandemia: Programa Pró-Brasil. Organizado pela Casa Civil, pelo Ministério do...

Brasil

Programa Pró-Brasil

Em 2020, o governo federal lançou um plano para estimular o crescimento econômico brasileiro após a crise da pandemia: Programa Pró-Brasil. Organizado pela Casa Civil, pelo Ministério do Desenvolvimento Regional e pelo Ministério da Infraestrutura, com o principal objetivo de reduzir os impactos sociais e econômicos, o plano está dividido em dois eixos: ordem (medidas estruturantes) e progresso (investimentos).

A estrutura de implementação do Pró-Brasil está dividida em cinco temas prioritários:

Infraestrutura: Áreas de telecomunicações, energia e mineração, transporte e logística e desenvolvimento regional e cidades;

Desenvolvimento produtivo: setores de indústria, agronegócio, serviços e turismo;

Capital humano: Saúde, capacitação de profissionais, cidadania, controle da corrupção, defesa, inteligência e segurança pública;

Inovação e tecnologia: Cadeias digitais, indústria criativa e ciência;

Viabilizadoras: Finanças e tributação, legislação e controle, meio ambiente e questões institucionais e internacionais e valorização das tradições.

O plano é abrangente, com 430 ações de curto, médio e longo prazo – este último com referência às obras de mais de dez anos5. O lançamento do Pró-Brasil trouxe consigo a retórica orçamentária que se estabelece na realidade dos estados e municípios brasileiros: restrição econômica versus necessidade de investimentos. Esse é também o motivo pelo qual a implementação do plano foi adiada, não tendo sido apresentada nenhuma novidade até agosto de 2021.

Portugal

Programa de Estabilização Econômica e Social

Ainda durante o ano de 2020, com base no The European Pillar of Social Rights Action Plan, Portugal lançou seu Programa de Estabilização Econômica e Social (PEES, 2020), em que as ações foram divididas em emergência, estabilização e recuperação econômica. O PEES está organizado em quatro eixos:

Emprego: Ações de proteção ao emprego e formação profissional; Geração de emprego na retomada econômica; Proteção dos trabalhadores formais e informais; Dinamização econômica do emprego; Apoio ao teletrabalho;

Social: Melhoria do acesso ao Serviço Nacional de Saúde; Universalização da Escola Digital; Combate à pobreza;

Empresas: Mecanismos de financiamento; Medidas fiscais; Prorrogação de prazos para pagamento de crédito bancário; Fundo de Capitalização das Empresas; Incentivo às cadeias curtas de distribuição; Aceleração de PME (empresas consolidadas); Promoção de novas áreas de negócios, como a Economia Azul;

Institucional: Finanças regionais e locais; Agilização dos procedimentos de contratação pública; Banco de fomento; Capacitação da administração pública; Simplificação de procedimentos da administração pública; Qualificação da justiça; Processo de insolvência e recuperação da empresa.

Como destacado no artigo Nova Proteção Social: Aprendizados e Inovações para um Futuro de Bem-Estar, da Iniciativa Reset, o PEES traça estratégias com base nas capacidades locacionais de cada uma das regiões de Portugal, incentivando a permanência da população em todo o território, evitando os vazios demográficos e os pontos mais distantes dos grandes centros, onde se concentram as populações mais idosas. O Plano destaca também a importância da Administração Pública na promoção do desenvolvimento, tanto pela universalização dos serviços públicos como pela geração de emprego, atualização e desburocratização de políticas públicas, além de respostas relacionadas à educação digital e qualificação profissional, ou seja, em consonância com a Agenda 2030 e os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.

Canadá

Plano de Resposta Econômica e Social

Da mesma forma que Portugal, o Canadá organizou seu Plano de Resposta Econômica e Social à Covid-19 com base em diversidades regionais. Foi um plano emergencial e que segue norteando as ações do governo canadense em cinco eixos:

Eixo I – Indivíduos: estratégias de proteção social vinculadas a Emprego e Renda das famílias, atenção às Comunidades Indígenas, com maior aporte financeiro para ações para este público;

Eixo II – Empresas: ações de redução de impostos e taxas, programas de proteção ao emprego; ações com ênfase nos jovens trabalhadores. Neste eixo, destacam-se ações para trabalhadores autônomos com filhos – que não conseguem trabalhar em função dos cuidados com as crianças (economia do cuidado);

Eixo III – Setores da Economia: ações para diferentes áreas, como: pesca, educação e pesquisa, infraestrutura, mineração etc. Foco na manutenção do emprego e da renda e na liberação de crédito e financiamentos;

Eixo IV – Apoio para Organizações: as organizações auxiliam no desenvolvimento das políticas de proteção social e cuidado com a vida, atuando em conjunto com a gestão pública. As áreas de maior atuação das organizações são: cuidado dos idosos e pessoas com deficiências, apoio à segurança alimentar e nutricional, distribuição de alimentos, na área da saúde mental de jovens, crianças e mulheres. Todas as ações são executadas com apoio de organizações, com repasse de recursos do governo.

Eixo V – Suporte para Províncias e Territórios: ações direcionadas à saúde, educação, renda e vulnerabilidade social, considerando as especificidades das províncias e dos territórios.

O plano canadense dá ênfase à diversidade regional, o que possibilita a atuação direta na necessidade local. Somada a isso, as organizações como braço de operacionalização permitem respostas mais rápidas e eficazes aos problemas econômicos e sociais. A atuação em redes estratégicas com foco nas capacidades e demandas locais é uma abordagem que pode servir de exemplo para planos estaduais.

Estados Unidos

Plano de Emprego Americano e Plano para as Famílias Americanas

Em abril de 2021, o atual presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, lançou dois planos de recuperação econômica que aspiram pesado investimento público no longo prazo. Muitas medidas podem ser encaradas como expansão das políticas públicas contra a pobreza já adotadas durante a pandemia de Covid-19. O “Plano de Emprego Americano” tem valor estimado de US$ 2 trilhões e, o “Plano para as Famílias Americanas”, pensado para 10 anos, é orçado em US$ 1,8 trilhão, com US$ 800 bilhões em corte de impostos, com foco primário na classe média8. Em decorrência da ousadia dos dois planos, Biden tem enfrentado resistência no Congresso, com dificuldade para aprovação dos valores. Segundo o governo americano, o custeio dos planos viria de uma reforma fiscal e tributária, revertendo as reformas de 2017, tributando os americanos mais ricos, que representam 0,3% dos contribuintes.

Origem dos recursos

O governo Biden propôs uma Reforma Tributária9 para financiar seus planos, o que englobaria: (a) aumento da taxa de imposto máxima para as pessoas físicas de 37% para 39,6%, afetando apenas 1% das famílias mais ricas. Os impostos aos mais ricos poderiam chegar a 43,8%, com o estabelecimento de um imposto fixo de 3,8% para todos os americanos que ganham mais de US$ 400 mil/ano; (b) Tributação sobre lucros de capital, como operações na Bolsa de Valores (atualmente 20%), podendo chegar a 39,6% para aqueles que recebem mais de US$ 1 milhão por ano; (c) Modernização do sistema tributário com investimentos de US$ 80 bilhões em aprimoramento com intuito de aumentar a arrecadação em 1%, por meio de receita não declarada dos mais ricos (que não declaram quase 20% de seus rendimentos). A sonegação descrita representa um déficit na receita tributária de US$ 175 bilhões.

As estratégias de recuperação econômica dos Estados Unidos

American Jobs Plan

Objetivo: Investimentos em infraestrutura e combate às mudanças climáticas, produtividade e crescimento de longo prazo.

Saneamento, Energia e Conectividade: Adequação da infraestrutura de água potável, eliminando tubos de chumbo. Renovação da rede elétrica, a partir da construção de novas linhas de transmissão e, do fechamento de poços de petróleo e gás e de minas abandonadas. Ampliação da velocidade da banda larga confiável e acessível para todos os americanos, incluindo os mais de 35% dos americanos rurais que não têm acesso com velocidade.

Infraestrutura: Consertar rodovias; reconstruir pontes e atualizar portos, aeroportos e centros de trânsito. Substituição de ônibus e vagões, melhoria em estações e instalações para expansão do transporte público e do serviço ferroviário em comunidades que mais precisam.

Qualificação da Mão de Obra: Criação de empregos bem remunerados, com trabalhadores treinados para as demandas de trabalho do futuro. Investimento em Pesquisa e Desenvolvimento, o que garante que a contribuição dos americanos beneficie famílias trabalhadoras e o desenvolvimento local, indo além da geração de empregos com alta qualificação somente para as multinacionais ou governos estrangeiros.

Inovação: Investimentos em inovação e revitalização da planta industrial, criando empregos de alta qualificação. Ampliação da produção de bens e materiais nos EUA para comercialização mundial.

Serviços: Criação de empregos de prestação de cuidados e aumento de salários e benefícios para trabalhadores de cuidados domésticos essenciais, já que a maioria é formada por mulheres negras, que fornecem cuidados domiciliares e comunitários para indivíduos que precisam esperar anos para obter esses serviços.

Moradia: Modernizar casas, edifícios comerciais, escolas e prédios federais. Construção de edifícios baratos, acessíveis, com eficiência energética e resilientes. Foco nas residências para idosos.

Justiça Social e Ambiental: O plano visa investir 40% dos benefícios em infraestrutura climática e limpa para comunidades desfavorecidas, assim como em comunidades rurais e aquelas impactadas pela transição baseada no mercado para a energia limpa.

American Families Plan

Objetivo: Recuperar a renda e a prosperidade social da população com foco na classe média, atacando as desigualdades sociais, considerando fatores como raça, gênero e local de residência (rural ou urbano).

Educação: Da pré-escola até a universidade: Proporcionar matrícula gratuita para os dois primeiros anos do jardim de infância e também para dois anos de estudos em universidades comunitárias.
Redução nos custos universitários para alunos de baixa e média renda em Faculdades e Universidades Historicamente Negras, Faculdades e Universidades Tribais e instituições que servem hispânicos, asiáticos e indígenas americanos das ilhas do Pacífico e outras instituições que servem as minorias. Investimento de US$ 9 bilhões para fortalecer os canais de professores e resolver a escassez destes profissionais; aumentar o número de professores negros.

Financiamento: Aumentar os créditos fiscais para as famílias com filhos e subsidiar o custo das creches, com base na renda, pelo American Rescue Plan por mais cinco anos. Crédito Fiscal para Cuidados de Crianças e Dependentes fornecendo até US$ 4 mil para cobrir despesas relacionadas aos cuidados de uma criança menor de 13 anos ou dependente com deficiência que necessite de cuidados e até US$8 mil para cobrir despesas de vários filhos ou dependentes. Tornar permanente a expansão do crédito de imposto de renda auferida para trabalhadores sem filhos, beneficiando trabalhadores de baixa renda, muitos dos quais são trabalhadores essenciais.

Trabalho: Criação do programa nacional de licença remunerada de até 12 semanas para quem precisa se afastar do trabalho para cuidar de um filho, de um parente ou para se recuperar de uma doença. Os trabalhadores receberiam até US$ 4 mil por mês, com o valor mínimo sendo fixado em dois terços do salário recebido. Garantir que ninguém que ganhe menos de 150% da renda média do estado tenha que pagar mais de 7% de sua renda com cuidados de alta qualidade para crianças menores de 5 anos.

Segurança Alimentar: Destinar recursos para o combate à insegurança alimentar. Expandir a assistência nutricional, incluindo programas de alimentação escolar e o programa de benefícios nutricionais de verão, para crianças e famílias.

Saúde: Investir US$ 3 bilhões em saúde materna. Reduzir os custos de saúde tornando as reduções de prêmio de seguro de saúde do American Rescue Plan permanentes, economizando uma média de US $50/pessoa/mês para as famílias.


Vale ressaltar que os planos não buscam retomar nem voltar para patamares e formatos anteriores à pandemia de Covid-19. Referem-se a reimaginar e reconstruir uma nova economia com investimentos em infraestrutura, reposicionando os Estados Unidos como a maior economia do mundo, superando a China. Outro ponto forte dos planos americanos é
a busca pela recuperação econômica com base na matriz energética, com incentivos à mudança no transporte e apoio às indústrias. No entanto, trata-se de recuperação alinhada com agendas globais de desenvolvimento e sustentabilidade.

Do ponto de vista político, os planos do governo Biden representam também uma tentativa de resposta aos desafios internos. Na questão do desemprego, por exemplo, embora a taxa ampla seja baixa, a falta de postos de trabalho para jovens e mulheres ainda é mais expressiva, já que o fechamento de vagas foi significativo depois da crise de 2008. Nesse sentido, o plano Biden tem foco na retomada de empregos qualificados para todos, inclusive com o estímulo à presença dos sindicatos. É um reconhecimento de que a geração de empregos de qualidade está associada ao acúmulo de capital e é saudável para o modelo da economia americana.

Há também o reconhecimento de que o modelo vigente de economia vem acelerando as desigualdades sociais internas, com um achatamento da classe média e o empobrecimento de uma parte da população – guardando algumas semelhanças importantes com o que ocorre em países latino-americanos e até mesmo no Brasil. Nesse sentido, os EUA devem destinar esforços para a proteção social, até mesmo para fazer sentido com seu modelo de neoliberalismo, ou o chamado “capitalismo democrático”.

Em paralelo, as questões geopolíticas, especialmente com a China, e ambientais estão em destaque. A política industrial precisa considerar a sustentabilidade na prática, sem ficar apenas no discurso. Este é um ponto fundamental também para o Brasil, que tem se sustentado no boom dos preços de commodities, especialmente com minério de ferro, petróleo e outros produtos que estão em oposição aos avanços da agenda ESG. A transição para a economia verde, ainda com ritmo a ser determinado, é real, mas também um desafio. É crucial dominar as tecnologias relacionadas à sustentabilidade.